terça-feira, 20 de março de 2012

Re-luto o real





Não há dor maior que a dor da impossibilidade de um coração, que sonhou com o céu de outra alma, que viajou por mundos e derrubou muros para estar perto. Sonhou sozinho uma realidade acompanhada. Um coração de partidas, idas e vindas trazendo o outro. Viajante, mas seguro do ponto de encontro: o tão sonhado e desejado (outro) coração*.
Viver da ilusão de tornar possível o impossível foi o desafio constante de manter viva a esperança. Tantas vezes pareceu haver escutado respostas; tantas outras pensou haver entendido sinais. Eram ecos ilusórios, miragens que se vê quando se atravessa os desertos da alma.
Cedo ou tarde a realidade seria deflagrada.
O coração chora lágrimas que desembocam num mar. Morto. Acabou a vida dos sonhos. Bem me avisara o luto que tanto neguei.  Difícil pensar num esvaziamento, numa ruptura de algo que se tornou parte da essência de um todo.
Nas lágrimas, todo o não dito, escrito, vivido. Densas lágrimas correm pelo rosto triste de quem, logo mais, terá que sorrir.
O coração está morto e, hoje, chora todas as suas mortes. Sem fim.


* Um outro coração pessoal; o outro coração do outro? Eu não sei.

quarta-feira, 14 de março de 2012

Adulteci





Quando meu coração dói por dores que não sei lidar, algo me diz que é preciso crescer. Mas, o medo me faz voltar aos sonhos de ser criança. Porque por mais que uma criança sofra, um sorvete é capaz de alegrá-la e as cores de um algodão-doce trazem de volta o brilho nos olhos...
A criança chora, mas em seguida é capaz de sorrir com a mesma intensidade das lágrimas. O bonito da infância é saber reagir diante das contradições.
Quando crianças, brincamos de ser adultos. E a gente cresce pra querer voltar a ser criança. Há nisso um sentido que ultrapassa o mero querer, penso. Eis o tempo e suas inadequações. O tempo que, para alguns, é um santo remédio. Se assim fosse, chamaria antibiótico. Mas, é o tempo, o senhor das transformações, que nos torna adultos.
(.....)
Lembro-me de quando abraçava minhas bonecas e o simples gesto amenizava os vazios que eu sentia sem entender.
A saudade era distraída com um brinquedo novo. O medo se traduzia num fantasma que poderia estar escondido no escuro. As dores e feridas eram curadas com afago e um remedinho.
Eu vivia com o joelho ralado e talvez fosse feliz. Não tinha muita consciência das coisas. Não sei se tenho hoje, mas tento não ser alienada.
Hoje, não machuco mais o joelho, mas tenho um coração rasgado, fragmentado em partes que se multiplicam em dores.
Não tenho mais bonecas, não me alegro com um sorvete. Outras coisas, ainda que poucas, significam a minha existência.
Eu cresci, mas não o suficiente. Tenho medo de viver e não conseguir viver. Apenas existir, entende?
Quando eu era pequena, eu tinha mais coragem, justamente por não saber o que isso significa.
Olho para a menininha ainda não esquecida, que vive em meu dentro.  Tão diferente do que me tornei hoje. (...) Ela me faz pensar que, para crescer, talvez seja necessário voltar a ser criança. Talvez.  Tudo o que um dia soube, ficou no tempo da minha infância.
Não há mais castelos e não sou a princesa que salva os desprotegidos.
Não consigo me salvar.
Não tenho abrigo.
Não sei brincar.
Não fantasio.
Não e nada.